Você sabe do que se trata a luxação de ombro? Sendo comumente conhecido como “ombro deslocado”, esse quadro afeta especialmente indivíduos que sofrem com traumas físicos e está mais presente em adultos entre 15-30 anos.
A luxação do ombro é um quadro muito doloroso e que limita muito a função do ombro acometido, então é muito importante o entendimento de como ocorre essa patologia e como podemos tratá-la.
Anatomia do ombro
O ombro é a articulação do corpo com maior arco de movimento, portanto sua estabilidade depende de várias estruturas trabalhando em conjunto. A articulação glenoumeral, que é a articulação entre o úmero e a glenoide, depende de várias estruturas para se manter estável durante os movimentos do dia-a-dia e principalmente quando realizamos atividades que aumentam a pressão no ombro como em atividades domésticas (como esticar roupas no varal ou então limpar prateleiras altas), esportes ou exercícios físicos na academia.
Articulação glenoumeral. Cabeça do úmero (azul) e glenoide (verde)
A glenoide é uma parte de um osso maior chamado escápula. Ela tem um formato de pêra, com um tamanho inferior ao da cabeça do úmero e uma profundidade relativamente pequena, sendo o apoio para que a cabeça do úmero possa se movimentar. Por essas características anatômicas, a estabilidade entre a glenoide e o úmero não é suficiente apenas pelo seu encaixe, sendo então necessárias outras estruturas para auxiliar na estabilização dessa articulação.
Glenoide
O primeiro elemento importante nessa tarefa é o labrum, que é um tecido que fica ao redor da glenoide, aumentando a sua área de contato da glenoide com a cabeça do úmero, aumentando também a sua profundidade, transformando a glenoide em um estrutura mais propícia para sustentar todos os movimentos da cabeça umeral.
Labrum ao redor da glenoide
Outras estruturas, como a cápsula articular, que é o tecido que recobre toda a articulação e os ligamentos que ligam a cabeça do úmero à glenoide (chamados de ligamentos glenoumerais), também tem um papel fundamental na articulação do ombro, promovendo a estabilidade necessária para que haja um movimento harmônico e controlado dessa articulação.
Cápsula articular ao redor do ombro (Vista frontal)
Cápsula articular ao redor do ombro (Vista lateral)
Saiba mais sobre a luxação de ombro
A luxação de ombro pode ocorrer em qualquer um dos ombros e, geralmente, é classificada com relação a direção que a cabeça do úmero se desloca.
Ela pode ser inferior, anterior, superior, posterior e, ainda, quando identificada de forma parcial, ser chamada de subluxação.
- A luxação inferior é definida como a que se direciona para baixo.
- A luxação anterior é definida como a que se direciona para frente.
- A luxação superior é definida como a que se direciona para cima.
- A luxação posterior é definida como a que se direciona para trás.
- A subluxação é definida como a perda de contato que não é observada de forma completa.
Normalmente, o primeiro episódio de luxação acontece após algum episódio de trauma, como por exemplo, traumas esportivos, acidentes automotivos ou quedas.
Quando ocorre uma luxação do ombro é necessário que haja uma avaliação urgente por um médico Ortopedista para que seja realizado o tratamento de maneira adequada.
Mas por que uma luxação de ombro ocorre e quais são os seus sintomas?
Conforme dito, a principal causa da luxação de ombro se dá em função de traumas físicos, como os advindos de práticas esportistas.
Porém, eles podem ocorrer por outros motivos
- Levantadores de peso, praticantes de esporte de contato e praticantes de atividades que possam causar torções ou traumas são os indivíduos mais propensos a lidar com a luxação na região do ombro.
- Pacientes que apresentam quadro de hiperfrouxidão ligamentar, sendo esses mais sujeitos a quadros de luxações espontâneas.
Levantamento de peso pode gerar instabilidade no ombro
Dentre os principais sintomas desse quadro pode-se citar a dor intensa e imediata após a lesão, a mudança no formato da região e bloqueios na mobilidade.
Um sinal clássico da luxação anterior do ombro é o sinal da Dragona, que remete ao termo dragona utilizado no uniforme militares, pelo fato do ombro perder o formato arredondado típico e se apresentar de maneira plana ou reta.
Sinal da dragona
Sinal da dragona
Tratamento para luxação na região do ombro
O primeiro passo do tratamento é a análise de possíveis danos à região luxada, como por exemplo fraturas, lesões de nervos ou vasos sanguíneos. Portanto, antes de qualquer manobra, é necessário que haja um exame físico minucioso seguido de uma radiografia simples do ombro. Em seguida, é preciso fazer a manobra para redução do ombro, que significa colocá-lo de volta em seu devido lugar.
Técnica para redução do ombro
Para que isso seja feito da melhor forma possível, é preciso ter certeza da direção em que o ombro foi deslocado. Em seguida, é realizada a imobilização do ombro com uma tipoia, seguida da prescrição de técnicas para alívio da dor.
Tipoia
Tanto medicações recomendadas, quanto aplicações de gelo podem ser feitas para o alívio da dor na região, que tende a desaparecer progressivamente.
Finalmente, é recomendada a prática da fisioterapia, a fim de fortalecer a musculatura da região e realização de técnicas para melhor controle da dor.
Luxação recidivante do ombro
Existe a possibilidade de ocorrer uma instabilidade residual após a primeira luxação devido a alterações no formato dos ossos após a lesão. No momento em que a cabeça do úmero se desloca para fora da glenoide, pode ocorrer lesões tanto na cabeça do úmero quanto na glenoide.
A lesão da glenoide é chamada de lesão de Bankart, que pode se referir a lesão do labrum ou mesmo de uma parte óssea da glenoide. Esse tipo de lesão causa uma diminuição da estabilidade do ombro, podendo então, ser suficiente para gerar quadros consecutivos de luxações.
Ilustração do local do Bankart
Glenoide com a lesão de Bankart
A lesão na cabeça do úmero é chamada de lesão de Hill-Sachs, e consiste em uma perda de parte do osso da cabeça, fazendo com que a cabeça fique com uma concavidade.
Essa concavidade pode se encaixar na glenoide durante os movimentos do ombro, gerando dor e instabilidade a essa articulação.
A recorrência da luxação do ombro depende de vários fatores, sendo que os homens, jovens, praticantes de esportes de contato e com lesões ósseas associadas (como o Bankart e Hill-Sachs) tem a maior chance de um novo episódio de luxação.
Para avaliar paciente com instabilidade crônica do ombro, necessitamos de um bom exame físico e exames de imagem complementares
No exame físico devemos avaliar se o paciente apresenta sintomas de instabilidade como dor ou sensação do “ombro sair do lugar”, realizando testes específicos como o teste da apreensão. Nesse teste, coloca-se o braço do paciente em posição demonstrada abaixo e o paciente refere a sensação de instabilidade. Outro fator importante no exame físico é avaliar se o paciente apresenta um quadro de hiperfrouxidão ligamentar.
Algumas pacientes apresentam uma elasticidade maior no corpo, conseguindo realizar movimentos além dos habituais, como esticar mais os joelhos ou os cotovelos, sendo um fator de risco quando associado a quadros de instabilidade do ombro.
Teste da apreensão
Nos exames de imagem, além da radiografia, podemos solicitar a tomografia computadorizada para avaliar lesões ósseas associadas (Hill-Sachs e Bankart), e a ressonância magnética para avaliar lesões ósseas e lesão do labrum, além de poder visualizar lesões outras lesões que podem ocorrer associadas no ombro como lesões do manguito rotador ou do tendão do bíceps.
Lesão de Bankart na glenoide
Lesão de Hill-Sachs na cabeça do úmero
Tratamento para a luxação recidivante
O tratamento conservador, ou seja, aquele em que não é realizado cirurgia, pode ser tentado em qualquer caso, porém sabe-se que a taxa de recorrência de luxações após o tratamento não cirúrgico é alta, principalmente naqueles que apresentam muitos fatores de risco para novos episódios como em atletas de esporte de contato, sendo então indicado para pacientes mais velhos e sedentários, pois apresentam menor risco de nova luxação.
O tratamento cirúrgico pode ser dividido em 2 tipos: o tratamento com cirurgia artroscópica e o tratamento com cirurgia aberta
Quando temos uma lesão pequena na glenoide e em pacientes de baixo risco (não atletas, mulheres, sem hiperfrouxidão ligamentar, lesões óssea pequenas) podemos optar pela cirurgia de reparo do labrum por via artroscópica. Nessa cirurgia, a articulação é visualizada pela câmera da artroscopia, e com uso de instrumentais são posicionadas âncoras absorvíveis (dispositivo que lembram um parafuso com fios ligados a ele), e dessa maneira podemos amarrar o labrum de volta ao seu local de origem, restabelecendo a anatomia normal do ombro. Essa cirurgia é chamada de Reparo artroscópico de Bankart.
Reparo de Bankart artroscópico
Em paciente com alto risco para uma nova luxação ou em pacientes com lesões ósseas grandes da glenoide, optamos pela cirurgia aberta. Essa cirurgia tem como conceito aumentar a área óssea da glenoide, e para isso um fragmento ósseo de outro local do corpo é fixado junto à glenoide para reparar a falha no osso e aumentar sua área de contato com a cabeça do úmero.
Esse fragmento ósseo normalmente é retirado do próprio ombro, de uma porção da escápula chamada de coracoide, podendo-se utilizar portanto a mesma via cirúrgica. Em casos em que a falha óssea da glenoide é muito grande e é necessário um grande fragmento, retira-se um enxerto ósseo da bacia. Esses fragmentos são fixados junto a glenoide com uso de parafusos.
A cirurgia em que é utilizada o coracoide tem o nome de Bristow-Latarjet, enquanto a cirurgia em que é utilizado uma fragmento da bacia é denominada de Edden-Hybinette.
Lesão na glenoide (Bankart)
Bloqueio ósseo na glenoide (Latarjet)
E a lesão de Hill Sachs? Normalmente não é necessário abordar a lesão de Hill-Sachs, ao menos que ela seja muito grande. Nesses casos, uma das cirurgias que pode ser realizada é a cirurgia de Reimplissage, em que utilizamos o tendão do infraespinhal (que é um dos tendões do manguito rotador) para cobrir a falha óssea na cabeça do úmero. Nesse caso, utilizamos âncoras no local da falha óssea e amarramos o tendão nesse local para que ocorra a cobertura da lesão.
No pós operatório o paciente utiliza uma tipoia em média por 3-4 semanas e inicia a fisioterapia após a retirada da tipoia.
Prevenção da luxação de ombro
Para prevenir a luxação, é possível fazer treinamentos que reforcem os tendões do manguito rotador e os músculos ditos como estabilizadores da escápula, para melhora a estabilidade do ombro.
Também é preciso apostar na conscientização de posições que devem ser evitadas, especialmente se o indivíduo já precisou lidar com a luxação de ombro anteriormente. Obtenha mais informações junto ao seu ortopedista!